1. “Educar bem é educar para a excelência” De há umas décadas para cá, o que se entende por educação transformou-se numa corrida para o pódio, numa formação intensiva e esforçada para que os nossos maravilhosos pequeninos se transformem em crianças “funcionais”, ótimos em tudo que fazem e com um promissor futuro, cheios de boas intenções ,treinamos, supervisionamos, proporcionamos experiências, desportos e atividades, terapias e estímulos. Desde cada vez mais cedo as nossas crianças - até os nossos adoráveis bebés - vivem em ambientes organizados, otimizados, hiper seguros, cheios de rotinas e ordem, regras e tarefas - ambientes nada amigos da infância, afinal. Valorizamos os feitos, os troféus, abusamos do elogio e do reforço positivo para que cheguem longe, sejam os primeiros, figurem no quadro de honra, recebam medalhas e estrelinhas de bom comportamento e, com frequência, esquecemos o que mais importa para uma infância saudável, para uma boa saúde emocional e mental : que se estabeleçam relações onde prevaleça o amor incondicional (que se sintam amados independentemente do que atingem, fazem ou conseguem ou não fazer). Esquecemos de lhes mostrar que são perfeitos como são, confiar nos seus instintos sobre que lhes dá prazer fazer ou não; não lhes perguntamos se riram, se se divertiram, se tiveram curiosidade e sentiram satisfação a fazer algo ou em determinada actividade e, em vez disso, promovemos, muitas vezes, que se desliguem de si próprios, do que sentem, do que gostam e dos seus limites. Colocamos o foco na disciplina externa e não no desenvolvimento da auto-disciplina - o verdadeiro segredo para serem adultos de sucesso é que se liguem aos seus gostos pessoais, à descoberta interna e exploração e não à competição, comparação e obediência. Com todo o nosso esforço para termos crianças “excelentes” , estamos constantemente a dizer (com palavras, atos e escolhas) que têm de provar o que valem, que têm de se esforçar para ser alguém(!), que têm de merecer o nosso amor (louvor, apreciação, elogio, atenção), que para serem queridos têm de corresponder às expectativas que a sociedade e nós criámos para eles. Ao olharmos constantemente para o “potencial” de cada uma das nossas crianças, esquecemos de ver - e os fazer ver - da(s) potência(s) que já têm: das valências, da energia, do vigor , de que são feitos no momento presente e não em qualquer momento, acontecimento futuro. Cada uma das nossas crianças é especial e normal ao mesmo tempo, e a infância é o tempo da exploração, da experimentação da descoberta de quem somos no encontro com os outros e com a sociedade, não é altura de treino especializado, não é altura de afunilar, é altura de abrir horizontes. Verdade: essa “excelência” que queremos para eles, que lhes incutimos ser importante atingir, todos sabemos muito bem, não assegura sucesso, amor, segurança, contentamento ou saúde e, com alguma certeza, vai até reduzir as possibilidades de encontrarem tudo isso ao longo da vida. 2. “Há crianças que se portam bem e crianças mal comportadas” Se formos verdadeiros - connosco próprios pelo menos - basta pensar um pouco e assumir que as crianças que os pais, a escola, os avós, rotulam de “bem comportada” é a criança sossegada, obediente, estudiosa, que dá beijinhos, auto controlada e calada - esta criança tão boa, na verdade, é boa a encaixar no nosso mundo de adultos, sem nos dar muito trabalho. São crianças fáceis, porque tornam a nossa vida mais fácil. Não nos desafiam, permitem-nos sentir no controlo da situação e não nos forçam a enfrentar questões desconfortáveis sobre quem somos ou como fomos educados. Já a criança que se porta mal é no fundo a criança barulhenta, hiperativa, agressiva, distraída, faladora, desafiante, teimosa. São as crianças que não ouvem e não nos respondem, que desafiam, batem, mostram desrespeito, certo? Errado. Estas crianças só estão a expressar sentimentos e necessidades, talvez de uma maneira desagradável para nós, mas que precisa de ser ouvida e não criticada, para que emoções e atitudes diferentes apareçam. Mas quando castigamos, rotulamos, criticamos e lhes retiramos amor, só lhes estamos a mostrar que estão ( são) erradas, que não deviam ser quem são e isto só as fará sentir ainda pior. Estas crianças que quebram as regras, geram desordem e testam os nossos limites estão a dizer-nos: “não me sinto vista, nem ouvida, nem reconhecida por quem sou, não sinto que faça parte da tua vida”. E são, na verdade, fortes e íntegras o suficiente para o mostrarem. Verdade: a alteração duradoura dos comportamentos só se consegue com conexão e respeito na forma de lidar com a criança. Mais importante do que parecer ter boa educação é ter de verdade uma boa saúde emocional; educar bem é permitirmos à criança ser autêntica, exprimir -se sem medo e faze-la sentir que tem nos pais um lugar seguro sempre que precisar. 3. “Educar bem é ter controlo sobre os filhos” O sentimento instintivo de que os filhos são “nossos” é natural, humano e universal. É a relação em que mais investimos, na qual nos revemos, onde colocamos mais expectativas e para a qual tendemos a olhar, cada vez mais nos tempos modernos, como um projeto que tem de sair perfeito. Acreditamos também que as crianças não sabem nada, são uma página em branco e frequentemente as tratamos como tendo menos valor do que nós. Por isso acreditamos que é nosso dever controlá-los, numa mistura de sentimentos e crenças - “eu sei o que é melhor para ele, preocupar-me é ser atento, estabelecer um plano para quem eles vão ser e como vão viver é o meu dever como pai” - em que entra muitas vezes o nosso ego, os nossos próprios medos, as feridas da nossa própria infância, e apenas o nosso mapa do mundo. Mas ser um bom pai é, na verdade, recordar, a toda a hora, que a parentalidade não tem nada a ver com cumprir planos pré-feitos na nossa mente e assumir, com humildade e coragem que nós não somos responsáveis por quem os nossos filhos se vão tornar, não somos nós que vamos torná-los em alguém, nem controlar quem eles são ou como se comportam. A nós, como cuidadores ,cabe-nos ser encarregados da sua saúde, segurança e bem estar - e mesmo isto tem os seus limites - cabe-nos manter sob controlo as nossas próprias ações, atitudes e pensamentos, ser donos do pai e da mãe que queremos mesmo ser, da pessoa que queremos ser perante os nossos filhos. Todos os valores que defendemos para os relacionamentos entre qualquer ser humano devem estar presentes no nosso relacionamento com as nossas crianças e educar bem tem de passar por os tratarmos com igual valor - isto implica respeitar os seus sentimentos, pensamentos, opiniões e formas de ser mas também a sua responsabilidade individual e integridade. Toda a nossa necessidade de controlar vem do medo, da insegurança, da sensação de escassez e ansiedade - os nosso filhos acabam por ser, à boleia deste princípio, os depositários de todas essas emoções. Os filhos não são nossos e não temos o direito de os privarmos das suas próprias experiências, não temos o direito de lhes dizermos como viver, temos a obrigação de confiar neles, cuidar deles e procura ser uma boa influência na sua vida. Teremos de resistir ao que vai dizer a sociedade, a família próxima e ao julgamento alheiro? Sim! Por isso a parentalidade consciente é um crescimento sobretudo para nós pais. Verdade : achamos que quanto mais controlo tivermos sobre os nossos filhos, mais os moldamos ou mudamos, mas o efeito é exatamente o oposto: ou os oprimimos e nunca serão capazes de expressar quem são de verdade ou se rebelarão e afastarão de nós e do nosso estilo de vida. - ❥ #marianabacelar
0 Comments
Leave a Reply. |
autor+artigos
December 2021
temasAll Comunicação Não Violenta Crianças Conscientes Ensino Consciente Inspiração Mãedfulness Parentalidadeconsciente Parentalidade Consciente Podcast |
o suave milagre | mariana bacelar